O divórcio na visão de uma criança

O que minha filha de 5 anos me ensinou sobre casamento e separação.

Marilia de Andrade Conde Aguilar

Meus quase 10 anos de casamento aliados a minha experiência como advogada me faziam pensar que sabia alguma coisa sobre casamento e divórcio.

Sou o tipo de pessoa que acredita que os relacionamentos familiares entre marido e mulher e entre pais e filhos transcendem a esta vida e foram feitos para durar por toda eternidade.

Infelizmente, minha prática profissional tem me mostrado que isso tem se tornado cada vez mais raro…

Eu já sabia que as crianças são os que mais sofrem durante um processo de separação, mas não imaginava a intensidade desse sofrimento até uma conversa que tive com minha filhinha de 5 anos.

Recentemente ela reclamou comigo que no dia anterior havia sido a última a ir embora da escola. Disse que isso era muito chato, porque ficou esperando sem ninguém pra brincar. Eu já sabia que meu marido saiu mais tarde do trabalho naquele dia e por isso atrasou para buscá-la.

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Em tom de brincadeira, disse a ela: “Pode deixar, filha. Quando o papai chegar, vou dar uma bronca nele e dizer que não pode atrasar!”

Ela arregalou os olhinhos e disse assustada: “Não, mamãe! Se você der uma bronca no papai, vocês vão brigar… E então, terão que se separar!”

Eu fiquei pasma com essa resposta, afinal de contas eu e meu marido nunca brigamos. Já tivemos nossas divergências de opiniões, mas sempre conseguimos resolver de forma civilizada. Ou seja, nossa filha nunca nos viu gritar um com o outro, muito menos falar em separação. Fiquei me perguntando de onde foi que ela tirou essa história de separação.

Então, perguntei a ela se os pais de algum coleguinha da escola estavam se separando, ao que ela respondeu que sim. Disse: “Os pais da Aninha e os pais do Carlos também (os nomes foram modificados). O Carlos disse que os pais dele brigavam o tempo todo.”

Meio sem jeito com a situação inesperada, disse a ela que quando um casal brigava demais, talvez fosse mesmo melhor se separarem. Ela respondeu com muita convicção: “Não, mamãe. Não é melhor! Porque dá muita saudade…”

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Perguntei a ela se o Carlos estava sentindo saudades do pai e ela respondeu que sim. E disse também: “Sabe qual é a pior parte, mamãe? É ter que ficar mudando de casa toda hora – um dia na casa da mãe, outro dia na casa do pai. Ele disse que isso é muito chato.”

Essa conversa me levou a refletir profundamente sobre a questão do divórcio. E dessa reflexão pude tirar as seguintes lições:

1. O divórcio nunca é um ponto final

Por mais simples e rápido que tenha se tornado o processo, o divórcio continua sendo trágico e doloroso quando ocorre e, às vezes, o sofrimento continua pelos vários anos seguintes.

Em quase todos os casos, a separação gera grandes transtornos emocionais, sociais e financeiros na vida das pessoas envolvidas.

E a verdade é, que apesar de tudo isso, o divórcio nunca é um ponto final da vida de um casal com filhos.

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Questões como guarda, pensão alimentícia, visitas e obrigações com a educação dos filhos terão que ser ampla e exaustivamente discutida por anos a fio.

2. Os filhos não entram na partilha dos bens

Parece óbvio, mas muitos casais em processo de divórcio parecem pensar que os filhos fazem parte dos bens materiais a serem divididos pelo casal.

Afirmo isso pela maneira com que vejo certos casais negociando (e até chantageando!) certos bens com base na definição dos critérios de visitas e guarda compartilhada.

Isso é uma atitude cruel e mesquinha e tende a tornar pior uma situação que já está pra lá de ruim.

3. Não existe “ex-pai”, nem “ex-mãe”

É impossível, emocional e legalmente falando, separar-se dos filhos.

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Como disse no primeiro tópico, por mais que o casal queira definitivamente cortar relações um com o outro, terão que arcar juntos com a responsabilidade da criação dos filhos.

Um pai ou mãe divorciados nunca deve criticar nem desautorizar o ex-cônjuge na frente dos filhos.

Não se preocupe em convencer seu filho da falta de caráter do outro, pois, se isso realmente for verdade, ele chegará a essa conclusão por conta própria mais cedo ou mais tarde.

4. O dever de remediar

Os pais têm o dever de buscar remediar ao máximo os danos emocionais causados nos filhos pela separação.

Se a ajuda profissional de um psicólogo for viável, será de grande utilidade para todos.

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Independente disso, e por mais desgastante que tenha sido o processo do divórcio, os pais precisam se esforçar por manter um relacionamento, se não “amigável” (sei que no começo isso pode ser impossível!), ao menos “civilizado”, em nome do bem-estar emocional dos filhos.

5. A responsabilidade de nutrir a esperança

É preciso tomar o cuidado de não destruir nas crianças a fé no casamento e na família.

Não é porque um relacionamento acabou que todos os outros estão fadados a acabar também.

O casamento pode não ter dado certo, mas a criança precisa saber (e sentir!) que ainda faz parte de uma família e que é amada. A segurança que reside nessa certeza é o que a ajudará a superar os traumas que porventura tenham se instalado e a ajudará a crescer um adulto sem medo de se comprometer em um relacionamento no futuro.

Nada do que eu disse aqui é fácil. Para falar a verdade, sei que é tudo muito difícil.

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Mas também sei que um pai e uma mãe que verdadeiramente amam os filhos estão dispostos a qualquer sacrifício pelo bem-estar de seus pequeninos. E farão tudo a seu alcance para que cresçam emocionalmente saudáveis para uma vida plena e feliz, apesar de todos os desafios.

Quando os pais se divorciaram, esse garoto lhes escreveu uma carta

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Marilia de Andrade Conde Aguilar

Marilia Condé Aguilar é advogada, escritora, esposa e mãe. Adora pesquisar e está sempre em busca de soluções práticas para ajudá-la a equilibrar suas responsabilidades familiares e profissionais.